Duas placas de identificação de um navio de guerra inglês afundado durante a célebre (e trágica) retirada das tropas aliadas em Dunkerque, na costa Norte de França, foram recuperadas do fundo do Canal da Mancha e devolvidas ao Governo britânico em cerimónia oficial decorrida ontem na cidade de Ypres.
Destinadas ao Royal Naval Museum em Portsmouth, as placas exibindo a insígnia e nome do "destroyer" HMS «Wakeful» foram recebidas pelo Embaixador inglês na Bélgica, Richard Kinchen, das mãos do Ministro flamengo dos Transportes, Gilbert Bossuyt.
O HMS «Wakeful», do qual provieram estas relíquias de guerra, mantém-se oficialmente imperturbado como túmulo marítimo de guerra, afundado a 13 milhas ao largo da costa belga, a uma profundidade de apenas 17 metros sob as águas da Mancha.
A maior operação de salvamento marítimo da História
Cercados e debaixo de fogo das forças alemãs, perto de meio milhão de tropas e refugiados de guerra encontravam-se encurralados entre as tropas perseguidoras e o mar. Em resposta, durante seis dias uma imensa frota partida de Inglaterra reunindo os mais variados navios e embarcações disponíveis civis e militares realizou uma manobra desesperada para chegar à cidade portuária de Dunkerque e praias circundantes, conseguindo salvar 340.000 tropas aliadas (115.000 das quais soldados franceses). A urgência e perigo da manobra (conhecida como "Operation Dynamo" ) deveu-se ao fulgurante avanço das unidades alemãs, que beneficiavam (nesta fase inicial da II Guerra) da superioridade aérea e sofisticadas divisões blindadas, no seguimento da bem sucedida "Blitzkrieg" (guerra-relâmpago) que resultou na frente de guerra ocidental com a anexação da Holanda, Bélgica e França. O comando geral da operação foi confiada ao Vice-Almirante Sir Bertram Ramsay.
A ousada campanha de salvamento saldou-se, porém, pelo afundamento de 235 dos 850 navios participantes. No entanto, apesar do successo da operação, mais de 50.000 veículos militares e 40.000 soldados franceses não conseguiram ser evacuados, após terem assegurado uma corajosa acção de retaguarda, tendo sido capturados pelas tropas alemãs. Segundo reza a História, o comandante militar do destacamento inglês, Major-General Sir Harold Alexander, terá sido o último soldado salvo das desoladas praias de Dunkerque.
No dia 29 de Maio de 1940, o "destroyer" foi torpedeado por um navio rápido (um "E-Boot", ou lancha torpedeira) da força de superfície alemã, pouco depois de ter embarcado cerca de 630 soldados evacuados das praias de Bray-Dunes, próximo de Dunkerque, uma operação que durou 8 horas. Após o primeiro torpedo ter falhado o alvo, a violência do impacte do segundo (que atingiu em cheio a zona das caldeiras) causou a quebra do casco em dois, afundando-se o navio em apenas 15 segundos. Só 25 tripulantes e um dos soldados conseguiram ser salvos.
Mas a tragédia não ficou por aqui: entretanto, o navio de guerra HMS «Grafton», que se encontrava nas proximidades tentou salvar os marinheiros do HMS «Wakeful», mas foi atingido por outro torpedo disparado pela mesma lancha torpedeira alemã e começou a fundar-se. Pior ainda, um outro "destroyer" inglês, o HMS «Comfort», que se aproximou para socorrer a tripulação, foi de imediato atingido e afundado por engano pelos sobreviventes do HMS «Grafton», confundindo-o com um navio alemão. Só neste único dia, a "Luftwaffe" (aviação militar alemã) afundou outros 15 navios.
Memória Submersa
Já em 2002, tendo em conta o tráfego acrescido de navios de maior dimensão e calado por cima do sítio de naufrágio em trânsito para o movimentado porto de Zeebrugge, a sugestão de remoção do casco causou grande indignação por entre os escassos sobreviventes e familiares das vítimas do ataque.
Em lugar desta polémica intervenção (dada a sua classificação de túmulo de guerra oficial), foi decidido remover apenas partes da superestrutura do HMS «Wakeful», como o mastro de comunicações e as chaminés, colocando-as junto aos bordos do "destroyer", não sendo contemplada em momento algum a retirada de qualquer destroço fora das águas onde encontrou o repouso final.
Notícia do "Scotsman".
Adenda
À boa maneira britânica, mais de 150 "little ships", embarcações ligeiras que tomaram parte na operação (entre navios de pesca, recreio, salva-vidas e diversas embarcações de apoio), hoje espalhadas pelo mundo inteiro, desde o Chile e Canadá até Malta e Chipre, foram cuidadosamente recenseadas pela "Association of Dunkirk Little Ships", tornando-se membros da Associação, participando nas reuniões anuais e nas frequentes travessias comemorativas do Canal. A embarcação mais pequena que se sabe ter participado na Operação Dínamo é o barco de pesca «Tamzine», de apenas 4,5 metros, actualmente conservado no Imperial War Museum em Londres.
Em Maio de 2005, Dunkerque será o palco da celebração do 65.º aniversário da operação, para onde rumarão os últimos navios e sobreviventes deste grande episódio da História europeia.
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