Um feliz acaso fez com que tenham sido descobertos este ano no Service Historique de la Marine (em Vincennes, arredores de Paris) os planos de Brutus de Villeroi, inventor francês e autor, em 1861, do projecto técnico do USS «Alligator», primeiro submarino da Marinha de Guerra dos Estados Unidos. Curiosamente, o próprio arquivo onde se guarda a caixa contendo estes papeis não possuia qualquer registo bibliográfico sobre os mesmos.
A Pasta 3084...
...do Arquivo de Vincennes continha nem mais nem menos que os "Plans du Bateau Sous-Marin", ou seja, os planos técnicos, até agora desconhecidos, deste submarino pioneiro. Contém desenhos de um submersível longilíneo, em formato tubular, com uma série de pequenas vigias, uma câmara de mergulho e o sistema de propulsão inicial, com remos retrácteis. A descoberta permitirá a revelação de aspectos obscuros sobre a concepção e o desaparecimento do primeiro submarino de guerra norte-americano.
A investigação decorre a cargo de uma parceria entre o Office of Naval Research (Departamento de Pesquisa Naval) da N.O.A.A. (National Oceanic and Atmospheric Administration) e a U.S. Navy (Marinha de Guerra dos Estados Unidos), reunindo especialistas e investigadores em História naval, Arqueologia Náutica, Oceanografia, Engenharia e Exploração Oceânica para discutir a possibilidade de localização e recuperação do submarino afundado.
Afinal havia outro (submarino)
Esta curiosidade tecnológica é, de facto, pouco anterior ao «Hunley» (veja-se um nosso "post" anterior) mas inclui-se claramente neste período fértil em progresso navais durante a Guerra Civil norte-americana, que viu nascer alguns dos primeiros e mais conhecidos navios couraçados semi-submersíveis da História, como o USS «Monitor» (do qual falaremos dentro em pouco tempo), e as respostas dos Confederados, com o CSS «Hunley».
De facto, o «Alligator» foi concebido originalmente para fazer face a uma canhoneira couraçada semi-submersível, o USS «Virginia», também conhecido nos Estados do Norte como «Merrimack».
Construído em Filadélfia, o «Alligator» media 14 metros de comprimento e deslocava 275 toneladas (à superfície; 350 toneladas submerso), albergando uma tripulação de 20 homens. O sistema inicial de propulsão a remos foi mais tarde substituído por uma hélice helicoidal à ré.
Uma das mais interessantes características do «Alligator» era o seu sistema pioneiro, embora rudimentar, de renovação do ar, eliminando a ameaça do excesso de dióxido de carbono no seu interior. Muito provavelmente, disporia de um compressor de ar para alimentar o mergulhador durante as suas missões. Ambas características marcaram um enorme avanço para a época e não voltaram a ser utilizadas em submarinos até ao final do séc. XIX.
Sobre o pai do «Alligator», o francês Villeroi, emigrado nos Estados Unidos alguns historiadores pensam que poderá ter tido influencia decisiva na mente imaginativa de um jovem discípulo na disciplina de matemática, Júlio Verne. Sabe-se ainda que Villeroi dedicou-se a experiências com navios submersíveis no Rio Delaware, tendo-lhe sido confiscado em 1861 um submarino anterior pela Polícia de Filadélfia, que suspeitava de alegadas "intenções traiçoeiras". Um excesso de elo que não impediu o desenvolvimento da prometedora arma submersa.
A Perda do «Alligator»
Lançado em Maio de 1862, o submarino nunca entrou em combate, embora tenha sido o primeiro submarino da US Navy a ser posicionado numa zona de guerra, em Hampton Roads, onde se planeara uma acção de demolição de pontes e obstáculos inimigos, sem sequência.
O próprio Presidente Abraham Lincoln, personagem fascinado pela tecnologia, terá testemunhado os trabalhos de remodelação a que foi sujeito em 1862 nos estaleiros de Washington.
No ano seguinte, ao ser rebocado (selado e vazio) pelo vapor USS «Sumpter» para uma nova zona de operações, no porto de Charleston, o «Alligator» afundou-se no meio de uma tempestade repentina, algures ao largo do traiçoeiro Cabo Hatteras, na Carolina do Norte. As últimas coordenadas registadas foram 34.43 de Latitude e 75.20 de Longitude ao meio-dia de 2 de Abril de 1863. Tendo cortado as amarras com que rebocava o submarino, o «Sumpter» só pôde tentar regressar ao local onde o abandonara à deriva um dia depois, mas sem sucesso devido à intensidade dos ventos.
A partir de então, o notável submarino caiu no esquecimento.
História, Mistério e Tecnologia Naval
O sistema ofensivo do «Alligator» consistia, supreendentemente num "hard-hat diver", isto é, um mergulhador "pé-de-chumbo" com capacete rígido enviado a danificar navios inimigos) em vez da carga explosva transportada num esporão à vante do «Hunley».
O mergulhador deixaria o submarino através de uma inovadora câmara de mergulho, transportando uma carga explosiva ligada ao submarino por cabos eléctricos, colocaria a carga ao casco a atingir, a qual seria detonada posteriormente por descarga eléctrica.
No entanto, o submarino destinava-se a operar apenas em águas fluviais e portuárias.
Em Busca da Arma Submersa
Um dos responsáveis por esta busca original, o Contra-Almirante Jay Cohen, Director do Office of Naval Research teve a ideia de lançar o projecto em 2002, quando esteve envolvido na bem sucedida missão de busca vedeta torpedeira ("torpedo boat") a bordo da qual servia o futuro Presidente John F. Kennedy durante a II Guerra Mundial, a célebre PT-109 afundada no Pacífico Sul.
Pensa-se que o «Alligator» se poderá encontrar a 3.000 metros de profundidade, nas proximidades do limite da plataforma continental norte-americana.
O primeiro Simpósio sobre o fascinante USS «Alligator» decorreu no Museu "Historic Ship Nautilus and Submarine Force" em Groton, no Connecticut, tendo servido para reunir e partilhar informações e novas descobertas entre especialistas sobre o submarino.
Leia-se notícia detalhada no Washington Post.
A história destes pioneiros navios submersíveis de guerra foi recentemente publicada por Mark K. Ragan, em "Submarine Warfare in the Civil War", em 1999 e reeditado em 2002.
Novas Descobertas Subaquáticas?
Segundo o director do Virginia War Museum, uma prospecção subaquática levada a cabo para construção de um terminal marítimo no Rio Elizabeth assinalou a existência de duas grandes massas metálicas afundadas. Os investigadores pensam tratarem-se dos destroços do semi-submersível couraçado CSS «Virginia» («Merrimack») e de uma escuna que colidiu com ele e afundou-se ao seu lado. O «Virginia» foi abandonado e destruído pela tripulação ao largo de Craney Island (Virginia) em 1862, depois de um combate com o seu rival directo, o USS «Monitor», também ele redescoberto a 73 metros de profundidade, cujas caldeira e torre de canhões foram removidas numa operação igualmente liderada pelo N.O.A.A..
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